"Essa música fala sobre se lembrar da primeira vez, mas hoje é a nossa primeira vez aqui", notou o inglês Jarvis Cocker, adepto de nostalgia e ironia em várias músicas que mostrou pela primeira vez no Brasil. A frase veio no início do show, com "Do you remember the first time?", um de seus sucessos entre fãs de rock dos anos 90. O Pulp, banda liderada por Jarvis, fez show animado por mais de duas horas na Via Funchal, em apresentação única em São Paulo, na noite de quarta-feira (28).
O cantor de 49 anos subiu ao palco de terno e gravata, à frente de um grande letreiro colorido com o nome da banda. Jarvis logo começou a dançar de paletó, que logo tirou para ficar de camisa social, como um tio bêbado em festa de casamento.
A turnê de reunião da banda, após uma década separada, tem mais clima de celebração do passado do que de novidade – não há expectativa de gravar material novo.
O último disco do grupo é “We love life” (2001), do qual tocaram apenas “Sunrise” em São Paulo. O Pulp lançou três álbuns entre 1983 e 1992 – ignorados no show -, mas ganhou destaque no movimento britpop de meados dos anos 90, com menos sucesso comercial e mais aprovação da crítica que os conterrâneos Blur e Oasis. Os maiores sucessos estão em “His 'n' hers” (1994) e “Different class” (1995), a base do repertório da turnê.
Ao lado de seis músicos, Jarvis monopolizou as atenções. Além de dançar como uma criança com roupas de adulto, a performance enérgica tem muito falatório, tanto nas frases em tom discursivo das faixas quanto nas conversas fartas com o público nos intervalos.]
O cantor mostrou dedicação acima da média de músicos estrangeiros para se comunicar em português. “You are show de bola”, misturando inglês e português, “balada”, “sinistro” e “vocês gostariam de dançar” estão entre as palavras que se esforçou para pronunciar.
Ele também fez questão de traduzir os títulos de duas das músicas mais celebradas da noite: “algo mudou”, ou “Something changed”, no encerramento, e “pessoas comuns”, ou “Common people”, maior hit do grupo. Outras festejadas foram “Disco 2000”, “Babies” e “Razzmatazz”.
A banda eclipsada pelo cantor é competente ao transitar entre a base para os versos ao estilo “contador de histórias” e os refrões eufóricos – quando é prejudicada pelo som embolado da Via Funchal, mas não perde a pressão.
A casa com capacidade para quatro mil pessoas tinha cerca de dois terços de seu espaço ocupado. Mesmo não lotando a estreia da banda no Brasil, o público se mostrou animado e íntimo do repertório. Quando Jarvis diz, em inglês, “não sei se vocês conhecem essa música, de um filme feito há muito tempo”, grande parte dos presentes já reconhece e canta “Like a friend”, do filme “Great expectations”, de 1998.
Um exemplo do talento dramático de Jarvis Cocker é em “Sorted for E’s and W´s”. Ele pergunta se alguém sabe se hoje é quarta ou quinta-feira, finge que comanda raios de luzes verdes do fundo do palco e faz imitação com a boca do som de música eletrônica. Parece papo furado, mas faz sentido antes da música sobre confusão mental e desespero ao final de uma rave, entre drama e humor – “você quer ligar para sua mãe e dizer que não voltar pra casa, pois perdeu parte de seu cérebro”, diz a letra.
Jarvis usa também truques menos sutis para manter a animação do público, como quando ensina palmas em sincronia no refrão da romântica “A little soul”, ou quando sobe em cima de uma grande caixa de som lateral para fazer movimentos como os de um strip tease antes da sombria “This is hardcore”. Talvez bastasse a nostalgia da reprodução de velhas músicas. Mas o líder do Pulp também merece crédito por manter a energia da mistura de monólogo e dança bêbada como se fosse a primeira vez.
Fonte: G1
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