Um mês após ação da polícia, Cracolândia resiste no Centro de SP
Presença de usuários de crack está pulverizada em ruas da região.
Comerciantes decidiram contratar seguranças após migrações.
Um mês após o início da operação da Polícia Militar de combate ao tráfico de drogas na Cracolândia, no Centro de São Paulo, a região, famosa por concentrar usuários, permanece agregando viciados em suas ruas. Apesar de há uma semana a secretária da Justiça do Estado de São Paulo, Eloísa de Souza Arruda, ter dito que a Cracolândia não existe mais, o G1 visitou a região nesta quinta-feira (2) e constatou o contrário. A presença do crack não é mais tão concentrada na Rua Helvétia, mas se espalhou, fazendo até com que comerciantes de outras áreas contratassem seguranças para espantar os “noias”.
Trinta dias foi o prazo dado pela PM para acabar com o tráfico na região. Um mês também era o que a vice-prefeita e secretária de Assistência Social, Alda Marco Antonio, previa para que fosse iniciada uma segunda fase, mais baseada no auxílio e na saúde, tendo como epicentro um complexo de saúde que é construído na Rua Prates. Apesar de mais de 200 pessoas terem sido presas na região, nem o tráfico foi totalmente cortado nem o complexo está funcionando – a data de inauguração agora foi estipulada para março.
As rondas da polícia são constantes e as abordagens também, mas foi criado um cenário de esconde-esconde. Os usuários param em um local para fumar e, quando a PM se aproxima, chegam a deixar o ponto em uma espécie de “procissão” à procura de outro local. Quando são abordados, entregam os cachimbos ou então tentam escondê-los.
Eles migraram principalmente para o entorno da Avenida São João, nas ruas Apa e General Júlio Marcondes Salgado, onde nesta quarta-feira (1º) havia um grupo de 40 pessoas, muitas usando droga. Os “noias” também vão para as ruas comerciais como Guaianazes, General Osório e Conselheiro Nébias, entre outras, quando suas lojas fecham as portas. Os comerciantes dessa região são os mais revoltados com a situação e vários contrataram seguranças.
É o caso de um proprietário de uma loja de produtos para veículos na Rua Guaianazes. “Pagamos uma pessoa para não deixá-los sentar aqui. A ordem é mandar circular”, afirma, sem querer se identificar. Ele diz lamentar não poder vigiar a loja 24 horas por dia. De madrugada, por exemplo, o segurança não trabalha, e o comerciante frequentemente encontra restos de droga e urina em sua porta pela manhã.
A estratégia é semelhante à do dono de um hotel da Rua Conselheiro Nébias, que divide com outros comerciantes o salário de um segurança que fica na rua. “Eles não são perigosos, mas prejudicam o movimento. Não podemos deixá-los parar aqui. E com a ação da polícia, eles vieram de forma massiva”, relata.
Entre os moradores ouvidos pelo G1, os argumentos principais são de que os dependentes não representam risco de assaltos. A moradora Vânia Andrade, de 45 anos, é um dos exemplos típicos da região. “Não gostamos de ver o bairro com sujeira, pessoas na calçada fumando, mas acho que a grande maioria não é de bandidos. São pessoas que precisam de tratamento, ainda que não queiram”, conta.
Tranquilos
Os mais animados com a ação da polícia são os donos de comércios localizados nas proximidades da Rua Helvétia, onde a presença dos policiais é mais efetiva. Nesta quinta, carros da Polícia Militar passavam com frequência no local, e havia ainda duas equipes da Guarda Civil Metropolitana (GCM).
O dono de um restaurante na Helvétia, perto da Alameda Cleveland, diz que a situação melhorou muito. “Não poderia estar melhor para a gente. Essa região tem prédios com moradores, e essas pessoas evitavam vir aqui quando a rua estava tomada pelos usuários." Perto da Helvetia, porém, o consumo ainda acontece, como o G1 flagrou na Alameda Barão de Piracicaba e na Praça Princesa Isabel.
Balanço
Desde 3 de janeiro, ocorreram 251 prisões na Cracolândia em ações policiais e da GCM. Foram realizadas também 11.882 abordagens policiais e apreendidos 63,8 kg de drogas. A Polícia Militar diz que só que vai se manifestar nesta sexta-feira (3) sobre o balanço de um mês de ações na Cracolândia e sobre os questionamentos do G1 de que o uso de drogas persiste na região. Procurada, a Secretaria de Assistência Social não respondeu sobre o fato de o centro de saúde da Rua Prates não estar funcionando após os primeiros 30 dias de ações.
Em nota enviada na manhã desta sexta-feira (3), a Secretaria de Segurança Pública (SSP) informou que os três principais objetivos estratégicos anunciados dia 4 de janeiro foram parcialmente atingidos peça Ação Integrada Centro Legal: “a quebra da estrutura logística do tráfico de drogas, a criação de condições para atuação dos agentes sociais e de saúde, além de outros órgãos e o resgate do espaço público pela cidadania”, informa.
Ainda segundo a SSP, “o poder público restabeleceu a livre circulação por todas as ruas do Centro de São Paulo, inclusive por aquelas que diariamente eram ocupadas por centenas de usuários de drogas (...) A operação atingiu a logística do tráfico de drogas na região central da capital. Prendeu alguns dos maiores fornecedores de entorpecentes, desmantelou pequenos laboratórios onde a droga era preparada, identificou depósitos, veículos e pessoas envolvidas com o tráfico naquela região.”
A secretaria admite que o consumo e o tráfico de drogas ainda ocorre na Cracolândia, mas “em menor escala”. A SSP admite a migração de usuários para outras ruas do centro e afirma que o policiamento foi reforçado. “O contingente mobilizado na Operação foi aumentado de cem para 287 policiais.”
A SSP anunciou que a Polícia Militar irá instalar três novas bases comunitárias móveis na região da Nova Luz, expandir o policiamento comunitário e reforçar a segurança no entorno com mais cem policiais militares. “Eles terão a missão de proteger o cidadão de possíveis migrações de usuários e traficantes. No total, um contingente de 387 policiais militares estará diretamente envolvido na operação Centro Legal.”
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